terça-feira, 20 de maio de 2008

Querido Primo por Diana Pimentel


“Querido primo,
Espero que esta te encontre bem...”



não há muito tempo mas parece tanto era assim que eu pressentia escrever-te.
era uma carta mas entretanto troquei-te e troquei-me as voltas
ou foi do sol que ardeu no último fim-de-semana de abril

ou do vento leste que quase (por muito pouco) não me tocou (eu estava longe da ilha – li nas notícias a previsão do tempo; leste? leste!? agora não se diz como sempre se disse “abril águas mil”...?).
? ou terá sido do voo (ou da viagem) que então me aconteceu (madeira/lisboa a planar // lisboa/porto a guiar)?
ou foi do regresso (porto/madeira a aterrar)?

foi com certeza da bilhardice que esta semana súbita e espantosamente nos apareceu, em tons quentes (vermelho vivo vermelho escuro), cores no CORação da cidade (e branco, a giz, a corrector, a lápis e a caneta, umas de feltro, outras bic (“escrita fina, escrita normal”...)
tantas letras a declarar o que não sabemos dizer em alta voz... eu não sei...)


trouxe o posto, estamos a postos, apertem os cintos de segurança (jornais? “chá, café, larajada...?”); vou contar-vos uma história: chama-se (disseram-me...) “boa viagem / boarding pass”. (confesso que sinto que “ler é muito mais difícil que escrever”...)

era uma vez cada um de nós – ilhéus, ilhoas, cubanos e madeirenses, estranhos e estrangeiros – portugueses todos, fumadores ( alguns)

todos sabemos que “fumar prejudica gravemente” a nossa saúde “e a dos que nos rodeia” mas – quase sem querer eu li em letras grandes e gordas num dos “postos de escuta” e de escrita pousados nesta cidade: “A bilhardice faz bem à saúde”. ora, não há melhor remédio...

ontem ao passar por esta avenida ao acaso e quase quase à hora do ocaso encontrei uma rapariga que falava uma língua estranha (turco? grego?)
disse chamar-se Rhodes e era muito mas mesmo muito antiga (do século XVI ou XVII, não me lembro bem)

explicou-me que nesse tão antigo passado era uma ilha e a ela se tinham encostado barcos, barcarolas, caravelas, cascos e mastros de dia por tanto tempo e sob os astros como faróis em terra firme firme 

muitos anos depois – contou-me entre a sé e o golden gate – tinha aderido ao “Movimento Nacional Feminino” (eram anos de guerra – eu não sei qual, mal tinha nascido – e escreviam-se aerogramas (uma espécie de envelopes sem papel, de cor parda “edição exclusiva” manuscritos enviados a favor dos “soldados de Portugal” por “correio aéreo” um presente da TAP dos anos 60 e 70...)

nesse tempo a sempre menina Rhodes correspondia-se com um garoto a quem tinham dado nome de rio (e de cão, já agora, sobretudo no norte, como muitos de nós sabemos...), era o Douro.

o rapaz nem era mau rapaz... às vezes – a brincar, entre bilhardices... – riam-se e perguntavam: vens de espanha ou és português...? quando desaguas no atlântico, encontras o minho ou segues oceano dentro? É que o gaiato tinha mesmo nascido numa terra minhota... 

essa vila era – e ainda é (concelho de Monção, distrito de Viana do Castelo) – Barbeita e na escola (ali um pouco acima do largo, logo a seguir a uma palmeira que entretanto foi crescendo como as nossas pernas e tem um sombra forte e alta como a região: Alto Minho)
bom, na escola a professora tinha-lhe ensinado que o nome da terra – Barbeita – era ancião (que é como quem diz velho sem ofender e valioso sem envaidecer demasiado, só um bocadinho...) e que tinha deslizado – como quem escorrega na neve ou na relva, devagarinho – da Galiza até ao primeiro rio da fronteira de Portugal (acho que isto em linguagem séria se diz que o nome Barbeito tem uma “origem peninsular” e que hoje – hoje mesmo, dia 7 de Maio – continua a haver um ramo insular, sem S, Barbeito, e um outro (eu cá acho que é o mesmo mas não sei...) galhinho ou ramo, BarbeitoS, como ensinou a professora, galego, que descende de uma outra cidade parecida com esta mas espanhola, pontevedra.
a verdade verdadinha desta história toda (ainda falta um bocadinho...) é que a Rhodes (que assim esguia alta e debruçada na areia perto do mar parece uma ilha ou uma sereia, não sei bem) e o Douro (que tem nome de rio e há tanto tempo atravessa o atlântico)
a Rhodes e o Douro que se conhecem há séculos
andam por aqui (agora agorinha..., não digam nada...)
vieram juntos num avião que desenhou riscos no céu
andam a ler sinais linhas desenhos um novo alfabeto nas galerias do Funchal 
demoram-se nos jardins – perdem o olhar e as palavras entre os jacarandás em flor e as árvores do fogo, encadeados, alcançados –
sentam-se, conversam, calam, falam falam falam
e depois – é urgente, não tarda há outra maré, a sétima onda, outra estação, o próximo voo e o “porto aqui tão perto” – fixam em película fotográfica momentos “para mais tarde recordar” 
a cores “serviço expresso”, na loja “foto sol” (numa rua chamada fernão ornelas, a caminho do mercado, explica o mapa que trazem na mão)
reparam entretanto na placa 
que lhes fala de “saudades de ouvir as suas (as nossas?) cassetes de música antigas” e pedem ajuda. “consulte-nos”, pede a placa e ambos consentem
(pedem a morada, talvez lhas enviem por correio e os hits re-voltem pela mão do carteiro cd’s muito novos agora sim, modernos, tão cheios de clássicos de todos os tempos)

lembram-se de repente ao andar pela rua Direita 
que lhes faltam tintas pincéis rolos pregos e cordéis (os quadros por pendurar nas paredes por pintar, em casa
a casa a que ambos voltarão de volta de novo)
Casa de Santo António 
e um número de telefone estranho escrito na fachada (no hotel tinham dito que o indicativo da região era 291, este parece de um outro lugar estranho...) era uma marca efémera que se tornou estranha (mas não errada, apenas estranha; se ligarmos, alguém atenderá?)


ainda há tempo pouco mas bastante
anda há lugar para diversões um jogo de bilhar 
(ou de snooker, à inglesa), um copo num bar “três estrelas”
poncha, da tradicional, se faz favor
telefonar para casa, ver a caixa de correio electrónica
encomendar sonhos 
encomendam sonhos
têm tempo de esperar que se façam
que arrefeçam
e de os provar 
sim, nesta cidade de espanto de encanto (que encanto.
canto a canto. que canto), algures perdida numa rua muito pequenina há uma “fábrica de sonhos”
(não contem, é segredo nosso...)

Rhodes e Douro voltarão a casa, por dentro da
“sombra das nuvens no mar” 
uma sombra olhada acima do mar acima das nuvens
lêem e vêem um mapa imenso de lugares e de mares por conhecer e aprender 
no banco do avião lerão estas palavras: “Há o contar os contos. Há o fazer as contas. Há ainda a cantiga. E então descemos até aos barcos e proa erguida frente às nuvens aterramos em Marte. (...) E depois há ainda isto. Amar-te sem dizer. Mas que passado já na tormentosa vaga no vácuo se prolonga. E assim chegámos à baía das línguas e dos lugares.” (E. M. Melo e Castro algures).

(para mim esse lugar é aqui aqui aqui. agora agora
nesta quase ágora entre tanta tanta água

Primo,
foste tu que descobriste que “barbeito” é “uma terra em pousio” (vinha escrito num livro enorme, lembras-te, claro.)
e “barbeito” é também um muro que une os contornos da terra cultivada (vinha no dicionário...)
ou a primeira colheita de um terreno (aprendi num livro antigo).
este que está aqui, por exemplo, é para ti. 
obrigada por me ensinares isto. e – quase sem quereres mas sabendo (imagino eu) – porque os postos de bilhardice que tu inventaste me lembram marcos de correio (eu gosto muito de marcos de correio marcas de correspondência marcas marcas),
daqueles marcos de correio dos antigos, vermelhos, altos e fortes, como aquele ali em frente, à saída do Teatro

vês ? vemos vamos ver ?
vamos. escreve-me
de volta na volta do correio escreves?

diana
funchal/lisboa, 24 de abril – porto/lisboa, 07 de maio ‘2008

Tribuna da Madeira 19-05-08

OPINIÃO
Data: 19-05-2008

“A Bilhardice” de RICARDO BARBEITO

“Promover a curiosidade, a reflexão, a questionação acerca dos objectivos da Arte Contemporânea”*… Este é o principal objectivo de qualquer projecto de Arte pública.

Esta questão vem a propósito de um projecto agora em exibição, promovido pela Funchal 500 Anos / CMF, em parceria com a Universidade da Madeira. O projecto chama-se “A Bilhardice”, e é da autoria do jovem artista plástico Ricardo Barbeito.

Sempre incentivei à concretização de projectos de arte pública no Funchal. Isto porque as instalações, performances, etc., fazem parte da evolução das Artes Plásticas, que há muito se vêm afastando do tradicional cavalete. Não é que as artes em termos tradicionais tenham deixado de existir, muito pelo contrário. Esta nova e contemporânea expressão só vem cimentar e incentivar a todos os processos de intervenção artística, fomentando ao diálogo e à reflexão sobre estes assuntos, indispensáveis para a sua dinâmica. E mais, nada disto é assim tão novo… mas isso fica para outra ocasião.

Só raramente no Funchal acontecem eventos de arte pública. Existe muita animação de rua noutros sentidos, mas a concretização de projectos de Arte Contemporânea expostos na rua, onde as pessoas vivem e circulam, é difícil de levar a bom termo. Porque estes projectos não são comerciais, e por conseguinte é extremamente difícil aparecerem candidatos a sponsors. Os seus objectivos são puramente estético-artísticos, e dificilmente se descobre uma empresa disposta a associar o seu nome a uma acção deste género. Ainda por cima é pouco usual acontecerem eventos desta natureza na cidade, portanto os nossos conterrâneos compreendem-nas mal, interessando por isso pouco a eventuais mecenas a seu apadrinhamento.

Mas este artista conseguiu concretizar o seu projecto. Vivamente recomendado pela Universidade, na pessoa da Professora Doutora Isabel Santa Clara, Ricardo Barbeito conseguiu interessar instituições públicas e entidades privadas na sua Instalação. Parabéns por isso, não deve ter sido fácil. É um exemplo para os outros, a nossa cidade bem precisa de projectos públicos de Arte Contemporânea, que por serem públicos cheguem a muitas pessoas, provocando o interesse e o diálogo acerca destas questões que normalmente não provocam muito interesse da parte do público em geral.

A Instalação que Ricardo Barbeito trouxe agora ao Funchal, é uma divagação sobre um fenómeno que já foi diversas vezes definido na cultura madeirense: “A Bilhardice”. Não é propriamente exclusivo da nossa terra, será certamente uma constante de todos os meios pequenos. No entanto, pelas inúmeras vezes que já foi assumida e tratada, ganhou previlégios de característica principal e especial da ilha Madeira.

Cheio de sentido de humor, com isso tudo brinca Ricardo Barbeito. O artista chama a atenção dos transeuntes através da colocação de pequenas cabines nos passeios públicos, “postos de bilhardice” como as chama. Com as indispensáveis “persianas”, equipamentos habilmente concebidos para se ver sem se ser visto… Ricardo Barbeito complementa esta acção com uma exposição/instalação central no Salão Nobre do Teatro, e diversas mesas redondas e intervenções de especialistas, onde estes assuntos das artes velhas e novas, publicas e privadas,. são debatidos.

Se o fotógrafo norte-americano Spencer Tunick fotografa, em nome da arte, multidões de corpos nus em locais públicos, se em nome da arte o artista de origem búlgara Javacheff Christo embrulha monstruosos edifícios públicos, Ricardo Barbeito concebe uma acção pública adaptada à vida sócio-cultural madeirense: sugere locais próprios para o amadurecimento e gestação da bilhardice regional. Assim, desafio todos a participarem em “A Bilhardice”. É uma acção nova, recente, contemporânea, com a frescura e o interesse próprios de todas as novíssimas coisas. E, para além disso, tem piada.


TERESA BRAZÃO

Diário de Notícias 11-05-08

O recolher obrigatório da bilhardice
Postos de bilhardice encontraram-se no Teatro baltazar Dias
Data: 11-05-2008

O 'Estado de Sítio' próprio das noites de sábado levou ontem ao recolher obrigatório dos 'Postos de Bilhardice', como medida preventiva contra males maiores.

Isto mesmo explicou ao DIÁRIO o artista plástico Ricardo Barbeito, que falou da necessidade de proteger os postos da 'ventania' que invade a cidade, movida pela euforia própria da febre de sábado à noite.

Os postos, da tão madeirense bilhardice, são parte integrante de um projecto multidisciplinar de arte pública efémera, happening/instalação. Inspirados na arquitectura civil da Madeira estiveram durante uma semana na Avenida Arriaga, em diversos pontos estratégicos, que definiram um trajecto até à instalação principal no Salão Nobre do Teatro Municipal Baltazar Dias. Seis dias em que foram alvo da intervenção pública e do público, que escreveu mensagens, colou fotografias, desenhou, abriu e fechou persianas. Seis dias que transformaram os "postos de bilhardice" vermelho vivo numa mescla de letras brancas, azuis, pretas. Mensagens, desabafos, desejos, vontade de rir, pretextos, e traduções livres de "bilhardice" para diversas línguas.

Tudo isto terminou ontem ao fim da tarde. Os postos, transportados pela força de vários braços, percorreram toda a Placa Central até junto da instalação mãe. Reunidos no átrio do Teatro Municipal Baltazar Dias, ali ficaram para, como explicou Ricardo Barbeito, cumprirem uma nova função: "ficarem a postos para ouvirem as conversas no intervalo da peça 'Elas sou eu'." Com o 'recolher obrigatório" dos postos de bilhardice recolheram-se também mensagens e intervenções da cidade, que ao longo desta semana mataram saudades desse velho hábito madeirense da bilhardice. A bilhardice assim exposta na placa mais central da cidade. A bilhardice a recolher mensagens, a fazer esquecer o 'sms', subitamente substituído pela caneta e o giz. A 'exposição-mãe' ainda pode ser hoje visitada, num projecto que pretende chamar a atenção para as especificidades do quotidiano regional, no que diz respeito à cultura, à linguagem, e à conjuntura artística actual, e que abarca aspectos relacionados com diferentes áreas do saber, aglutinadas numa linguagem artística que visa a reflexão, a ironia, a questionação e a crítica, em relação a um dos aspectos mais característicos do Homem como ser social - a comunicação.

Raquel Gonçalves

Diário de Notícias 09-05-08

5 Sentidos
Arte em lugares inesperados
Data: 10-05-2008

'Bilhardices' foi tema da palestra proferida ontem por Isabel Santa Clara, no Teatro Baltazar Dias, no âmbito da 'Bilhardice, projecto de intervenção estético-artística para a cidade do Funchal', do artista Ricardo Barbeito. Integrando um conjunto de imagens, a intervenção foi uma oportunidade para ver lugares possíveis de arte contemporânea, atendendo a que hoje, conforme referiu a professora da UMa, "as intervenções artísticas aparecem nos lugares mais inesperados".

Isabel Santa Clara estabeleceu o relacionamento entre a intervenção de Ricardo Barbeito, que decorre até amanhã na Avenida Arriaga e no Baltazar Dias, com experiências efectuadas por outros artistas, em outras cidades e épocas.

Alexandre Melo, outro dos oradores, considerou o trabalho de Ricardo Barbeito "muito conseguido e muito estimulante, pelos vários níveis de reflexão e de intervenção que permite". O crítico de arte evidenciou, entre outros aspectos, a riqueza formal da intervenção. "Parte de objectos, como as persianas que fazem parte da vida quotidiana e da memória histórica das casas, e submete-os a metamorfoses, que lhe dão outra forma de presença, quer em termos de estrutura quer em termos de interacção com a cidade, em especial com as pessoas que circulam".

O projecto de Ricardo Barbeito visa, segundo o artista, "a ironia, a reflexão a crítica em relação a um dos aspectos mais característicos do Homem enquanto ser social: a comunicação".

T.F.

Diário de Notícias 07-05-08

Casos do dia



Instalações de artista aparecem vandalizadas
Data: 07-05-2008



Algumas das instalações colocadas por toda a cidade a fazer promoção da exposição do artista plástico Ricardo Barbeito apareceram deslocadas do sítio inicial onde tinham sido colocadas.

Uma delas, que se encontrava exposta na Rua João Tavira, apareceu ao contrário e terá sido arrastada até perto da estrada onde circulam os automóveis.

Ontem à tarde alguns transeuntes pararam em frente à 'janela de cor vermelha' com a frase 'Posto de bilhardice' e tentavam perceber a intenção do artista.

O autor do projecto, Ricardo Barbeito, não se incomodou com a situação. Apesar de desconhecer quem terá movido a instalação ficou satisfeito porque "é sinal de que as pessoas estão a interagir com o meu trabalho", salientou deixando escapar alguns risos.

Não deixou de ser uma ideia original por parte de Ricardo Barbeito por ser inovadora e provocatória chamou a atenção das pessoas que circulam nessas artérias.

Muitas desconhecem o objectivo outra preferem associar-se ao artista madeirense e deixaram marcas pessoais como assinaturas e outras mensagens. Todos podem colaborar através da inscrição de uma frase, relembrou Ricardo Barbeito, que na oportunidade disse ter achado interessante a frase de alguém: 'Aqui vou ser feliz'.

Filipe Gonçalves

Jornal da Madeira 06-05-08

Tema de exposição e conferências no Teatro Municipal do Funchal
Bilhardice invade passeios do Funchal



Os “postos de bilhardice” que Ricardo Barbeito espalhou ontem pelas placas centrais da Avenida Arriaga suscitaram, desde logo, a curiosidade e divertimento dos que passavam pelo local. O objectivo é mesmo esse, conforme diz o artista, que espera que o público participe neste evento dedicado a formas de comunicação. Uma exposição e um ciclo de conferências no Teatro completam o projecto sobre “A Bilhardice”.

Alguns «postos de bilhardice» estão espalhados pelas placas centrais da Avenida Arriaga. O objectivo deste projecto de Ricardo Barbeito é o de promover uma intervenção estético-artística irónica e cheia de humor que, simultaneamente, convide as pessoas à comunicação.
O projecto está inserido nas comemorações dos 500 anos da cidade do Funchal e inclui uma exposição e um ciclo de três conferências sobre o tema da bilhardice, que estão a decorrer no Salão Nobre do Teatro Municipal Baltazar Dias.
A exposição no Teatro é constituída por uma instalação de som e luz, naquilo que o artista considera ser uma expressão de arte contemporânea.
Referindo-se aos “postos de bilhardice” que se encontram nas placas centrais entre a Sé e o Teatro, Ricardo Barbeito explicou que estes eram os locais onde mais se propiciava o velho hábito da “bilhardice” no Funchal. O vermelho escolhido para a pintura desses elementos reporta para a cor dos postos de Correio e das cabines telefónicas londrinas, sítios que representam áreas da comunicação humana.
Conforme disse o artista plástico madeirense, este projecto «pretende chamar a atenção para as especificidades do quotidiano regional, para a cultura, para a linguagem e para a conjuntura artística actual».
Ricardo Barbeito disse que «o público está convocado a participar no debate», podendo fazê-lo quer usando os referidos postos, quer através de opiniões expressas no site www.ricardobarbeito.com.


Conferências no Teatro

Quanto ao ciclo de conferências, a primeira foi realizada ontem e teve como convidada a artista plástica Luísa Cunha.
A artista confessou não ser muito dada a aceitar convites oficiais, mas garantiu não ter hesitado um momento quando recebeu o convite de Ricardo Barbeito, a quem nem conhecia. «Este convite foi a coisa mais divertida e absolutamente inédita que me aconteceu na vida», disse Luísa Cunha, que já viveu alguns anos na Madeira e conhece o tema da bilhardice. Aliás, conforne disse, a sua obra está muito associada a este tema.
Refira-se que no dia 7 de Maio, pelas 18 horas, Carlos Valente, Diana Pimentel e Helena Rebelo darão a sua visão sobre esta temática.
O ciclo termina a 9 de Maio com uma conferência dada por Alexandre Melo e Isabel Santa Clara.

Jornal da Madeira 05-05-08

CULTURA
Data: 05-05-2008

Hoje apresentado no Salão Nobre
“A Bilhardice”no Teatro Municipal

É hoje apresentado no Salão Nobre do Teatro Municipal Baltazar Dias, às 18h00,“A Bilhardice: projecto de intervenção estético-artística para a cidade do Funchal”, da autoria do artista plástico Ricardo Barbeito.
Trata-se de um projecto multidisciplinar de arte pública efémera, happening/instalação que conta com a participação dos alunos de Teatro/Interpretação do Conservatório-Escola Profissional das Artes da Madeira, dirigido por Eduardo Luiz.
Após a cerimónia inaugural deste projecto, segue-se uma conferência pela professora Luísa Cunha que abordará a temática da “bilhardice”.
Esta iniciativa está integrada nas comemorações dos 500 Anos da Cidade do Funchal.


Odília Gouveia

PRESS: Diário de Notícias dia 6 de Maio de 2008

Data: 06-05-2008


'Bilhardice' promove reflexão sobre arte
O Projecto inclui um ciclo de conferências que decorre até sexta-feira


O projecto está patente ao público até domingo.
Joana Sousa


'A Bilhardice, projecto de intervenção estético-artística para a cidade do Funchal' foi inaugurada ontem no Salão Nobre do Teatro Baltazar Dias. Promover a curiosidade e reflexão sobre a arte contemporânea é um dos objectivos, conforme revelou o artista responsável, Ricardo Barbeito.

A exposição compreende duas situações: 'Postos de Bilhardice', instalados na Avenida Arriaga e a 'Central da Bilhardice', situada no Salão Nobre do Teatro Municipal Baltazar Dias.

No primeiro caso, trata-se de uma intervenção pública urbana, que se caracteriza pela utilização de objectos de madeira inspirados na arquitectura civil da Madeira. De cor vermelha, estão situados em pontos estratégicos, e definem um trajecto até à instalação principal situada no Baltazar Dias, onde tem lugar uma pequena intervenção arquitectónica, acompanhada de uma instalação sonora.

No âmbito deste projecto, está também agendado um ciclo de conferências no Teatro Baltazar Dias. A primeira decorreu ontem e foi proferida pela artista Luísa Cunha, que abordou, entre outros aspectos, os conceitos de público e privado. Amanhã, pelas 18 horas, a palestra é da responsabilidade dos professores da Universidade da Madeira, Carlos Valente, Diana Pimentel e Helena Rebelo. Estará em destaque multimédia, literatura e linguística. Na sexta-feira, a intervenção será proferida pelo crítico de arte, Alexandre Melo e por Isabel Santa Clara.

A exposição é acompanhada do 'site' www.ricardobarbeito.com que disponibiliza um catálogo interactivo. Permite o envio de comentários para um 'blog'. "A participação do público está assegurada, desde que queira", conclui.

Teresa Florença

PRESS: Diário de Notícias dia 3 de Maio de 2008

'Bilhardice' na Avenida Arriaga e no 'Baltazar Dias'
Ricardo barbeito apresenta a partir de segunda-feira uma intervenção multidisciplinar

Data: 03-05-2008

Promover a curiosidade e a reflexão sobre a arte contemporânea é um dos objectivos de 'A Bilhardice, projecto de intervenção estético-artística para a cidade do Funchal', que será inaugurado a 5 de Maio, na Avenida Arriaga e no Salão Nobre do Teatro Baltazar Dias. Neste espaço, terá também lugar uma conferência sobre o tema, proferida pela artista Luísa Cunha, pelas 18 horas.

Da responsabilidade de Ricardo Barbeito, 'A Bilhardice' constitui um projecto multidisciplinar de arte pública efémera, happening/instalação e compreende duas situações. A primeira, é uma intervenção pública urbana que se caracteriza pela utilização de objectos de madeira intitulados 'Postos de Bilhardice'. Inspirados na arquitectura civil da Madeira, serão dispostos na Avenida Arriaga, passeio público do Funchal. Conforme explica o artista, "a sua configuração e a cor - aliadas a uma dinâmica estabelecida através de pequenas representações de alunos de teatro/interpretação do Conservatório - Escola das Artes - vão definir a interacção dessas cabinas com o público em geral".

As peças, situadas em pontos estratégicos, definirão um trajecto até à instalação principal situada no Salão Nobre do Teatro Municipal Baltazar Dias. Ali, terá lugar uma pequena intervenção arquitectónica, acompanhada de uma instalação sonora.

Sobre o projecto, que estará patente ao público até 11 de Maio, Ricardo Barbeito diz que "pretende chamar a atenção para as especificidades do quotidiano regional, no que diz respeito à cultura, à linguagem, à conjuntura artística actual".

Abarca diversos aspectos relacionados "com diferentes áreas do saber, aglutinadas numa linguagem artística que visa a reflexão, a ironia, a questionação e a crítica, em relação a um dos aspectos mais característicos do Homem como ser social - a comunicação", acrescenta.

Sobre o tema 'bilhardice', afirma que representa ainda um fenómeno perfeitamente actual e pertinente, tendo em conta o contexto sociocultural no qual se vive. "É um fenómeno social, cujo termo, apesar de ser um regionalismo, corresponde ao que se passa em qualquer parte do mundo." A intervenção, orientada no sentido de levar a que a comunidade conheça os novos caminhos da arte, é o seu projecto para dissertação de mestrado em 'Arte e Património: no contemporâneo e actual', a realizar na UMa. A iniciativa integra-se no programa de comemorações dos 500 anos do Funchal.

Teresa Florença

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Susana da Gama



Na verdade foi através de uma Bilhardice que mais uma pessoa teve o privilégio de conhecer um projecto dessa categoria….e tenho de admitir que seria um dos últimos temas que me tivesse passado pela cabeça desenvolver, e precisamente por isso despertou tanto a atenção não só minha como de todas as pessoas que pisam as ruas do Funchal. Começando pela originalidade do projecto e acabando pelas ideias que a partir dele podem surgir.
Sou uma pessoa das artes ou melhor dito, estudando para isso; e gostava futuramente ter a oportunidade de ser criadora de um projecto como o seu, que cause na sociedade signos de interrogações por toda a nossa massa cinzenta sobre a questão a ser abordada e que depois concluíssem… ahhh final não tem só aspectos negativos, neste caso a “BILHARDICE”
Sinceramente dispenso por completo as áreas relacionadas com as letras (da para perceber pela minha pouca imaginação para a escrita), tento sempre transformar as minhas palavras em simples ou complexos riscos que aglutinados tentam dizer alguma coisa, sem ser preciso recorrer a escrita…mas com a segunda conferência que assisti sobre o seu projecto, foi muito útil para aperceber-me que afinal a literatura, mais explicitamente o português, não é assim tão mau.
O jogo de palavras que foi utilizado, a arte e a literatura em simultâneo, a origem da palavra, ver como as línguas também podem chegar a ser um meio artístico…é muito interessante. Quando falo de português como meio artístico, refiro-me a palavras como bilhardice, e claro muitas outras, que foram criadas por vocês madeirenses para provavelmente adquirir maior facilidade oral. Portanto, a criatividade dos falantes não tem limites…e onde existe criatividade existe arte…
Vejo que língua também procurou o seu caminho para se evidenciar, como todas as áreas. Lembro-me muito bem desta questão, que foi colocada na conversa de ontem, Se já há palavras com o mesmo sentido, para quê criar outra “diferente” com o mesmo significado?...
É sem dúvida arte…
É também agradável/ divertido ver como de um jogo de bilhar passamos a uma bilhardice =)…e curiosamente atribuída as mulheres por estarem muito tempo sem fazer nada. Eu diria o contrario “A bilhardice foi criada pelos homens”.
Sim pelos homens, porque se não estou em erro a fins do séc. XVIII, eram eles que não permitiam que as mulheres fossem trabalhar, portanto elas, “coitadas”, com tanto tempo sem fazer nada tinham de arranjar algumas forma de se distrairem... Portanto, os culpáveis foram os homens. Claro que é uma ideia a desenvolver e reflectir, com tempo…isto para tentar demostrar as vertentes e os subtemas interessantes que deste projecto podem surgir.

Atribuiria também à bilhardice, os sinónimos de conhecimento/ curiosidade/ perspicácia, enfim, palavras positivas que sempre contribuíram para o desenvolvimento do ser humano… porque, se não fosse assim, qual a necessidade de colocar o tapa-sol de modo a abrir só a parte do meio? Curiosamente ao alcance do nosso olhar…ou revistas e jornais que não só informam, como também nos põem a par da vida dos famosos e das celebridades…os reality shows… o mais curioso é que nós gostamos, não só de ver como também de participar. Será que todos temos um bocadinho de bilhardice nas veias? Provavelmente sim, e quem souber aproveitar de forma positiva esse espírito bilhardeiro, conhecerá coisas fantásticas que a vida tem para oferecer, e aprenderá ao ver os outros…assim como eu aprendi ao vê-lo a si…
Gostei muito do seu projecto, desejo-lhe muito sucesso e se algum dia precisar de alguma ajuda/ ideia, terei todo o prazer em fazê-lo…

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Banda Sonora da Bilhardice, Raquel Gonçalves



"Atenção, atenção, Sítio da Panasqueira, Câmara de Lobos. Para a Senhora Clotilde do seu marido, ausente na Venezuela, que lhe dedica a música: 'O Divórcio'.

Quatro da tarde já alta, e a rádio, abafada pelo bordado Madeira, deixava escapar por entre as sombras da latada os acordes da 'Música Pedida'. Posto Emissor em onda média debaixo do bordado da senhora Nazaré.

A senhora Nazaré e a vizinha, que dizem que é bruxa, a falar da vida alheia. Da outra que o marido fugiu quando foi comprar um pacote de cigarros 'Boa Viagem'.

A outra era sempre o alvo da bilhardice. A outra que não era sempre a mesma. Mas que ficava assim sem nome, reduzida a 'outra' porque as paredes têm ouvidos.

A 'outra' que fumava, a outra que traia, a outra que era desmazelada com o marido e com os filhos. A 'outra' que decora os horários do marido para meter o 'outro' debaixo dos lencóis.

"Se eu te agarro com outro te mato, te mando algumas flores e depois escapo". A rádio a servir de banda sonora à bilhardice. A realidade a imitar a 'música pedida'. A realidade a escapar pelas sombras da latada. O pé a fugir do sapato, a aliviar os joanetes e os calos.

O dedal e a agulha a desenharem flores no Bordado Madeira.

A tesoura e a língua afiadas de fazer garanitos.

As linhas e o cuidado para que não se sujem. (O senhor da 'Casa Jana' não gosta de bordados sujos).

E os miúdos a andarem por ali, entre o bordado, as sombras da latada e a 'Música Pedida'.

A infância embalada pela bilhardice dos adultos, pelo Posto Emissor, pela 'Outra' a quem o marido fugiu.

Boa Viagem.

Cigarros.

Ida sem regresso em pacote azul com um barco desenhado.

E barcos de papel no charco já a tarde se faz noite. A caçar girinos que, um dia, se fazem rãs.

A 'outra' tirou o 'outro' de debaixo dos lençóis. Grita pelos miúdos. É hora do jantar.

Recolhem-se as linhas, o bordado. Apaga-se a rádio, embrulha-se a bilhardice até amanhã,

Raquel Gonçalves

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Bilhar, disse ele



PLAC!!
As bolas estão dispersas sobre a mesa rectangular revestida a verde. O jogo começou. O triângulo foi desmontado, agora a estratégia e a imaginação tratam do resto. A bola branca é o carrasco do plano estratégico das jogadas que vão levar à vitória de um dos intervenientes. Com ela, sete bolas numeradas e de diferentes cores vão ser expulsas do jogo, depositando-se nos buracos que se encontram entre as tabelas, ficando apenas a bola preta à espera de ser protagonista na jogada final, que encerra o jogo. Durante todo este processo, um sem fim de angulações e de trajectórias estabelecidas, definem o jogo que se caracteriza pela constante visualização mental das movimentações pautadas, muitas vezes, por golpes de sorte ou simplesmente pela genialidade dos adversários. A sapata e o snooker, definem a vitória absoluta e a impossibilidade de progredir, respectivamente. O enredo continua, os choques e embates, os PLAC’s frequentes, definem a musicalidade arrítmica do desenrolar das tacadas que não podem, nem mandar a bola branca para fora da mesa, nem tocar com ela, antes do tempo, na bola preta. A penalização acontece e uma das bolas já expulsas volta a entrar no jogo.
O jogo da comunicação e da transmissão de mensagens através de diferentes canais e meios, resulta da imaginação e curiosidade, que definem as estratégias da bilhardice no que diz respeito às relações interpessoais. Quem nunca foi alvo de bilhardice e quem nunca bilhardou? Este factor aglutinante ou desagregador no âmbito do social, revela-nos que este aspecto não é sempre negativo, e às vezes até é saudável. Tal como no bilhar, os choques e confrontos entre as pessoas acontecem e traduzem-se num sem fim de trajectórias e movimentações.
A bilhardice, segundo o que o conhecimento empírico nos diz, é a reflexão e discussão colectiva da vida de terceiros e nunca acontece se for sobre coisas ou animais, e ninguém bilharda sobre si mesmo.
No contexto regional são vários os aspectos que se relacionam com esta temática sem, no entanto, se distanciar do contexto global. Em tempos considerados remotos, este fenómeno acontecia apenas no quotidiano urbano ou rural, nos adros das igrejas, junto aos fontanários, nos encontros fortuitos ou programados, nas reuniões familiares, a partir das janelas ou por detrás das bilhardas do tapassol. Actualmente a bilhardice alargou os seus horizontes e modernizou-se dispondo dos diferentes meios de comunicação, e é potenciada através de reality shows, revistas cor-de-rosa, talk shows matinais e vespertinos, inspirados na vida privada de celebridades.