terça-feira, 20 de maio de 2008

Tribuna da Madeira 19-05-08

OPINIÃO
Data: 19-05-2008

“A Bilhardice” de RICARDO BARBEITO

“Promover a curiosidade, a reflexão, a questionação acerca dos objectivos da Arte Contemporânea”*… Este é o principal objectivo de qualquer projecto de Arte pública.

Esta questão vem a propósito de um projecto agora em exibição, promovido pela Funchal 500 Anos / CMF, em parceria com a Universidade da Madeira. O projecto chama-se “A Bilhardice”, e é da autoria do jovem artista plástico Ricardo Barbeito.

Sempre incentivei à concretização de projectos de arte pública no Funchal. Isto porque as instalações, performances, etc., fazem parte da evolução das Artes Plásticas, que há muito se vêm afastando do tradicional cavalete. Não é que as artes em termos tradicionais tenham deixado de existir, muito pelo contrário. Esta nova e contemporânea expressão só vem cimentar e incentivar a todos os processos de intervenção artística, fomentando ao diálogo e à reflexão sobre estes assuntos, indispensáveis para a sua dinâmica. E mais, nada disto é assim tão novo… mas isso fica para outra ocasião.

Só raramente no Funchal acontecem eventos de arte pública. Existe muita animação de rua noutros sentidos, mas a concretização de projectos de Arte Contemporânea expostos na rua, onde as pessoas vivem e circulam, é difícil de levar a bom termo. Porque estes projectos não são comerciais, e por conseguinte é extremamente difícil aparecerem candidatos a sponsors. Os seus objectivos são puramente estético-artísticos, e dificilmente se descobre uma empresa disposta a associar o seu nome a uma acção deste género. Ainda por cima é pouco usual acontecerem eventos desta natureza na cidade, portanto os nossos conterrâneos compreendem-nas mal, interessando por isso pouco a eventuais mecenas a seu apadrinhamento.

Mas este artista conseguiu concretizar o seu projecto. Vivamente recomendado pela Universidade, na pessoa da Professora Doutora Isabel Santa Clara, Ricardo Barbeito conseguiu interessar instituições públicas e entidades privadas na sua Instalação. Parabéns por isso, não deve ter sido fácil. É um exemplo para os outros, a nossa cidade bem precisa de projectos públicos de Arte Contemporânea, que por serem públicos cheguem a muitas pessoas, provocando o interesse e o diálogo acerca destas questões que normalmente não provocam muito interesse da parte do público em geral.

A Instalação que Ricardo Barbeito trouxe agora ao Funchal, é uma divagação sobre um fenómeno que já foi diversas vezes definido na cultura madeirense: “A Bilhardice”. Não é propriamente exclusivo da nossa terra, será certamente uma constante de todos os meios pequenos. No entanto, pelas inúmeras vezes que já foi assumida e tratada, ganhou previlégios de característica principal e especial da ilha Madeira.

Cheio de sentido de humor, com isso tudo brinca Ricardo Barbeito. O artista chama a atenção dos transeuntes através da colocação de pequenas cabines nos passeios públicos, “postos de bilhardice” como as chama. Com as indispensáveis “persianas”, equipamentos habilmente concebidos para se ver sem se ser visto… Ricardo Barbeito complementa esta acção com uma exposição/instalação central no Salão Nobre do Teatro, e diversas mesas redondas e intervenções de especialistas, onde estes assuntos das artes velhas e novas, publicas e privadas,. são debatidos.

Se o fotógrafo norte-americano Spencer Tunick fotografa, em nome da arte, multidões de corpos nus em locais públicos, se em nome da arte o artista de origem búlgara Javacheff Christo embrulha monstruosos edifícios públicos, Ricardo Barbeito concebe uma acção pública adaptada à vida sócio-cultural madeirense: sugere locais próprios para o amadurecimento e gestação da bilhardice regional. Assim, desafio todos a participarem em “A Bilhardice”. É uma acção nova, recente, contemporânea, com a frescura e o interesse próprios de todas as novíssimas coisas. E, para além disso, tem piada.


TERESA BRAZÃO

Sem comentários: